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Herman Miller de olho no escritório do futuro

Por Jeniffer Oliveira - 08 de Outubro 2018
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Quantas inovações uma cadeira pode carregar? Designers da fabricante de móveis Herman Miller vêm tentando responder a esta pergunta há décadas. A primeira grande inovação da marca criada em 1905 veio a partir de uma técnica para moldar madeira compensada. A descoberta do casal Charles e Ray Eames gerou uma prótese para oficiais da marinha americana e, em 1946, a cadeira que seria considerada o melhor design do século XX pela revista Time.

 

Ao longo das décadas seguintes, a Herman Miller investiu no conceito de ergonomia, criou uma cadeira que mitiga o acúmulo de calor, usou tecnologia para gerar flexibilidade e inclinações que acompanham as variadas posturas de uma pessoa que senta oito horas (ou mais) por dia no escritório. Seu modelo de negócio envolve pesquisar tendências com designers e universidades e delegar a fabrição das criações a uma rede de distribuidores e parceiros. Depois, é a própria Herman Miller quem monta suas mobílias - a cadeira Eames, por exemplo, é feita até hoje de forma totalmente artesanal. Sem robôs ou automação. Cada parafuso é montado por uma pessoa.

 

Nos últimos anos, a marca começou a usar big data para entender o futuro do open office. A empresa quer estar mais próxima dos millennials, ser menos luxo e mais "lifestyle" e, claro, promover a sua própria transformação digital. Em uma das fábricas de montagem da empresa em Michigan (EUA), o VP de Design de Produtos da marca, Gary Smith, conversou sobre os investimentos da empresa em inovação.

 

O que inovação significa para a Herman Miller?

Inovação é pensar o que os outros não pensam. No nosso negócio, envolve descobrir materiais e usar a criatividade para resolver problemas que ninguém estava resolvendo. Ou nem sequer sabiam que existiam. Ninguém se queixava da questão térmica de uma cadeira. O que a pesquisa da Herman Miller mostrou é que há um desconforto causado não só pela pressão dos ossos da pessoa que senta, como pelo acúmulo de calor gerado. Parte da inovação que trouxemos na nossa cadeira Aeron foi mitigar esse calor [a cadeira é sem espuma, com uma película que não retêm umidade nem calor do corpo e que vendeu 7 milhões de unidades em sete países]. Pesquisamos, buscamos talentos para criarmos algo que não seja apenas referência de mercado. É uma atitude que visa o longo prazo, que pensa naquilo que as outras pessoas não estão pensando e capaz de produzir produtos que gerem uma nova experiência.

 

Você defende que é preciso usarmos o design para resolver problemas. De que forma?

Uma das frentes do nosso negócio é pensar em como gerar maior saúde e bem-estar no escritório. Isso perpassa pesquisar como as pessoas apoiam o corpo enquanto trabalham, como podemos ajudá-las a se mover melhor e ficarem mais confortáveis. Também perpassa analisar comportamentos psicológicos. Algumas pessoas são introvertidas. Outras extrovertidas. Algumas têm dificuldade de se concentrar, enquanto outras querem estar 100% do tempo conectadas. Um dos grandes desafios para a indústria que a Herman Miller atua é gerar opções de mobília não só com diferentes dinâmicas e tamanhos, mas também para personalidades variadas. Independente da personalidade, todas as pessoas trabalham hoje com celulares e notebooks e nossa mobília precisa acompanhar isso. Essa mesa aqui vai durar 5 anos, 50 ou uma vida inteira? Posso produzir móveis para a empresa durar 30 anos, mas novas ferramentas tecnológicas de trabalho surgirão todos os anos. E aí nosso desafio é: como isso muda a dinâmica de trabalho? Como garanto o bem-estar das pessoas, mas também gero ferramentas para o uso da tecnologia no trabalho?

 

A Herman Miller trabalha com universidades, cientistas e designers para criar inovações. A cadeira Cosmo, por exemplo, demorou 7 anos para ficar pronta. Qual é a linha de pesquisa atual que mais tem interessado vocês?

Estamos fascinados por entender e pesquisar a manufatura aditiva [processo de impressão de objetos a partir da deposição de variados materiais em camadas]. E que, na verdade, é algo muito maior do que usar impressão 3D. É um novo olhar sobre o processo de confecção. Em toda a história, os produtos sempre foram produzidos da mesma forma: grandes máquinas de fundição produzem a base do aço, fazem o molde, uma lâmina de serra corta a madeira e faz a prensagem. Mas tudo isso custa muito dinheiro e limitações: só serve para fazer todos os produtos da mesma forma e iguais. A manufatura aditiva é mais flexível e abre a possibilidade de criar um produto único para cada um de nós. Muitas empresas já utilizam no mundo, mas não de uma maneira que acompanhe um processo de produção em grande escala. Não conseguimos ainda, por exemplo, usar essa tecnologia para uma linha que produz cadeiras a cada 20 segundos. Quando conseguirmos usá-la, nossa ideia é conseguir produzir uma cadeira com ergonomia personalizada para cada pessoa. Uma cadeira que leve em conta a diferença dos corpos. Seria como ter um alfaiate personalizado. Quão longe isso é do futuro? Ainda não sei te responder.

 

O que você considera como o escritório do futuro?

Pense na sua casa. Existem áreas projetadas para fins particulares: tomar banho, comer, diversão e dormir. Qualquer projeto residencial incluirá esses quatro elementos. Mas tenho certeza de que as casas em que vivemos são diferentes. O escritório do futuro segue essa mesma analogia. Possui aspectos em comuns, mas é desenhado de acordo com os objetivos e cultura do negócio. Há 35 anos, eu tinha um escritório do tamanho de seis metros com uma porta. Há 25 anos, eu provavelmente tinha um cubículo de 3,6mx3m. Há 5 anos, um escritório de 1,8mx2,4m. Hoje, eu não tenho nenhum espaço exclusivo. Vou onde meu trabalho precisa que eu vá. E essa é realmente a premissa fundamental do escritório do futuro. O lugar é proposital - você projeta lugares para trabalhos específicos e as pessoas se movimentam entre eles. E múltiplas variações existentes: há empresa que precisam de mais privacidade, outras de maior interação. Quem precisa de mais telas ou mais computadores. É uma questão de construir o que é necessário. Não há julgamento sobre qual escritório é o certo e qual o errado.

 

Essa noção de escritório já é presente em várias empresas. Há algo que você está insatisfeito com esse modelo e não tem solução ainda?

O que me incomoda nesse formato mais aberto e flexível é que ainda não inventamos uma forma, um design, um produto, que sinalize às pessoas a minha disponibilidade para ser interrompido. Às vezes, preciso estar muito focado e não quero interação. O que as pessoas têm feito para demonstrar isso é usar fone de ouvido ou se virar de costas. Mas são atitudes que a afastam dos outros. Acho que esse é um problema universal e que eu gostaria de resolver. Mas não é tão simples quanto parece.

 

(Com informações da Época Negócios)

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