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Cultura da pergunta é essencial para inovação

Por Marina - 27 de Junho 2018

Para que efetivamente haja inovação nas empresas é preciso que os empreendedores busquem mudanças em sua cultura. Isso significa que, mais do que uma questão de tecnologia, é preciso cultivar o pensamento inovador. É isso que defende Gisela Schulzinger, fundadora da Haus Design e presidente da Associação Brasileira de Embalagem (Abre).

 

A profissional, figura obrigatória em rodas de discussão sobre inovação na indústria, fala sobre o tema com a experiência de quem conviveu de perto com as principais empresas do Vale do Silício.  E começa a responder com duas perguntas (isso mesmo, com duas perguntas!) dirigidas aos empresários do setor: “O que o mercado perderia se sua empresa deixasse de existir? Que diferença a falta dela faria para os consumidores?”

 

Para ela, essas são perguntas fundamentais a todo empresário que deseja passar por um processo de inovação. “É basal que os líderes entendam o valor de seus próprios empreendimentos, por isso essas perguntas devem ser feitas sem medo”, afirma. E brinca: “não é fácil perguntar, porque quem procura, acha”, se referindo ao medo dos empresários de encontrar pontos negativos nos seus negócios.

 

Segundo a especialista, a dificuldade em questionar é um problema amplo e cultural entre os empresários brasileiros. “Nós aprendemos a dar respostas, mas não aprendemos a elaborar perguntas. É provável que as próximas gerações sejam mais preparadas para encarar o novo mundo, mas atualmente o desafio de acompanhar as mudanças é muito grande, porque é preciso mudar o modelo mental que estamos acostumados”, explica.

 

Diante dos “novos tempos”, as empresas já entenderam que precisam mudar. No entanto, o problema, segundo Gisela, é que ainda não foi assimilada a urgência dessa transformação cultural. “A tecnologia avança cada vez mais rápido, mas de nada adianta ter boas ferramentas se não soubermos como usá-las”, alerta.

 

Por isso as pessoas têm um papel essencial no processo de inovação.  A tecnologia não apenas mudou a forma como as pessoas se relacionam, mas influencia diretamente em como a sociedade se organiza. “Costumamos ter uma visão fragmentada, mas as mudanças não ocorrem só nos pequenos grupos. O que quero dizer é que não basta olhar para dentro da empresa, o empresário tem que estar conectado com o mundo”, defende Gisela.

 

E que mudanças são essas?

 

A facilidade no acesso e propagação de informações impactou tanto as relações humanas, que mudou a perspectiva de transparência. “As empresas têm que se posicionar de uma maneira mais transparente porque os consumidores (e colaboradores) também estão exigindo isso”, explica Gisela.

 

Pensando nisso, é necessário não só abrir o diálogo com os clientes, mas ter uma colaboração interna mais efetiva. “Afinal, antes de mudar o mundo é preciso mudar sua aldeia. Temos que acabar com os departamentos fechados, com essa maneira de trabalhar cada parte isoladamente. É preciso criar espaços em que as pessoas sejam mais propensas a colaborar”, afirma.

 

 

 

 

 

Segundo Gisela, as empresas fazem muitos workshops para ensinar como usar novas ferramentas, mas não propõem debates para estimular a mudança na maneira de pensar. As empresas têm que explorar mais espaços de conversas. “Um exemplo bom são as áreas de P&D, onde os lançamentos são apresentados e todos os colaboradores podem opinar sobre o produto”.

 

Na perspectiva do cliente final, por sua vez, é necessário perceber que o critério de concorrência não gira em torno da qualidade do produto, mas sim como o consumidor enxerga esse produto. “Hoje os consumidores são mais empoderados, as decisões não são mais a partir da capacidade da empresa, mas sim a partir da necessidade do consumidor”, explica.

 

Como mudar?

 

Sobre como gerar as mudanças, Gisela enfatiza que quando se pensa na importância da “cultura da pergunta”, pesquisas são sempre necessárias, mas as metodologias também mudaram. “É necessário sempre questionar, mas com embasamento e um propósito, não só perguntar por perguntar”, simplifica.

 

Segundo a especialista em inovação, considerando que cada forma de pesquisa tem uma função, não é fácil escolher a melhor maneira de investigar o mercado sozinho. Mas, independentemente de contratar uma pesquisa terceirizada, a empresa tem que se voltar para fora. “Uma pesquisa pode trazer a você os problemas, as possibilidades de soluções, mas você tem que saber interpretar aquilo e não tem outra maneira a não ser estando sempre conectado com o que está acontecendo ao seu redor”, argumenta.

 

Cada empresa tem que entender do que ela é capaz, mas tem que ir além, é preciso saber como utilizar sua capacidade para atender as novas demandas, pontua Gisela. “A Nokia foi capaz de desenvolver um smartphone, mas a Apple agregou os aplicativos. É por isso que a Apple faz tanto sucesso, porque ela está antenada com o que está acontecendo no mundo e viu, de antemão, que a questão não era mais só o produto, e sim o serviço”, exemplifica.

 

Outro ponto aconselhado por ela é abrir-se para conceitos como o “Open Innovation”, ou Inovação Aberta. Sob a sombra do “colaborativo”, a grande mudança da abordagem é justamente promover ideias, pesquisas e processos dentro e fora de sua organização, sabendo aproveitar talentos de forma muito mais ampla. Com isso, segundo a especialista, se acende a perspectiva de desenvolvimento para os consumidores, permitindo cocriar junto com ele. “Assim, as necessidades serão melhor entendidas e supridas pelos produtos desenvolvidos”, enfatiza. E acrescenta que agora o produto não deve ser desenvolvido a partir da capacidade da empresa, mas sim a partir da necessidade do consumidor.

 

Gisela ressalta que, a despeito de tantos exemplos falhos, muitas empresas insistem em manter um modelo de negócio só porque ele fez sucesso no passado. “O que te trouxe até aqui não é o que vai te levar adiante”, cita, em referência ao especialista americano em gestão, Marshall Goldsmith, em sua obra premiada no Harold Longman Award, de 2007.

 

Ainda assim, apesar da resistência de muitos líderes em mudar o seu modelo mental, Gisela acredita que os empresários “antenados” iniciarão, em breve, um efeito manada. “Algumas empresas que são referências estão situadas com as novas demandas e começando as mudanças, então outras vão querer fazer o mesmo para não ficar para traz”, finaliza.

 

Máteria publicada originalmentena Móveis de Valor 176. Para conferir a edição completa clique aqui

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